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Fique de Olho nos seus Direitos: Resistir para Re(existir) - Direitos Indígenas e Pandemia

Publicado: Sexta, 03 de Julho de 2020, 18h26 | Última atualização em Quarta, 08 de Julho de 2020, 11h34

O Comitê para a Promoção dos Direitos Humanos, Igualdade Étnico-Racial e de Gênero, do IFSP Câmpus Presidente Epitácio, coloca em foco a garantia de direitos e chama a atenção da comunidade para ficar de olho nos seus direitos nesse período de quarentena, para combater e minimizar as consequências da pandemia pelo COVID-19.

Ao longo da campanha foram abordados dez temas, desde a proteção de mulheres, crianças e adolescentes contra a intensificação da violência doméstica, refletimos sobre a garantia dos direitos à educação, à saúde, ao trabalho, à alimentação, à moradia e à liberdade de expressão com prevenção do discurso de ódio, destacamos a acessibilidade e inclusão de pessoas com deficiência, o combate ao racismo e os desafios das pessoas LGBTQIA+.

Chegamos então a última publicação da campanha educativa “Fique de olho nos seus direitos em tempos de pandemia”, que abordará os direitos indígenas, por meio de um texto escrito especialmente para essa ocasião, poderemos refletir, conhecer e aprender um pouco mais da realidade indígena.

imagem sem descrição.

Acompanhe agora o relato do Professor Ismael Kaiowa:

Resistir para re(existir) - Direitos indígenas e pandemia

Para os Guarani, viemos do outro lado do mar, da terra sem males, lá de onde somos e vivemos como os verdadeiros povos originários deste imenso país.

Somos vozes que ecoam em busca do bem comum, do direito de sermos quem somos, vivendo em um país plurinacional formado por 305 povos falantes de 264 línguas e tantas outras etnias que constituem esse imenso Brasil. Vozes tantas vezes silenciadas por violentos massacres durante 520 anos, mas como diria Marçal de Souza “Arrancaram nossos frutos, cortaram nossos galhos, queimaram nossos troncos, mas não conseguiram matar nossas raízes”.

Desconsiderados de uma forma totalmente preconceituosa, somos personagens dos primeiros capítulos da história deste país. Nos negaram o direito de ser e de viver conforme os nossos costumes e tradições, éramos aqueles seres que fazíamos parte da natureza, sendo assim precisávamos ser domesticados, evangelizados e integrados à dita sociedade. Impediram-nos de exibir a grandeza e exuberância da nossa cultura tradicional negando a nossa presença, tutelando-nos a sermos escravos e a escravizarmos uns aos outros.

É preciso entender o antes e o depois, o passado e o presente, tempos das sociedades indígenas, para tentar traçar um paralelo perante esta fase em que se encontra os povos indígenas, dando protagonismo e visibilidade aos atores indígenas para que a partir de então possamos dizer quem somos, onde estamos e o que queremos sendo parte da sociedade nacional.

Somos os guardiões do portal do mundo onde os nossos corpos são territórios, com outro olhar e estratégias próprias, perspectivas positivas utilizando as experiências passadas para planejar o futuro. Sujeito à própria história, sem direitos aos nossos territórios demarcados, seguimos na defesa do meio ambiente, quebrando paradigmas, usando nossos corpos, nossas cores, nossos costumes para ocupar e democratizar os espaços.

Mato Grosso do Sul é o segundo estado brasileiro com maior população indígena do país. São oito etnias que aqui vivem (Guarani Nandeva, Guarani Kaiowa, Kadweu, Kinikinau, Ofayé, Terena, Guato e Atikum) somando 80.459 habitantes.

“Vidas indígenas importam”. Porém, não é isso que estamos vendo neste período pandêmico, pois o mesmo chega como uma avassaladora enchente, um verdadeiro tsunami, que ao passar, revela ao mundo toda sujeira da humanidade, deixando a vista o “lixo”, assim como a pobreza e a extrema miséria da população e o abandono deixando a mercê os povos indígenas.

Se antes a situação das comunidades tradicionais já era precária, seja nas aldeias demarcadas ou de retomadas, o Covid-19 reforça o descaso do governo federal, anulando ainda mais os nossos direitos, garantidos na Constituição Federal de 1988. A pandemia traz à tona todo sofrimento, escancarando a total falta de ações governamentais que garanta um mínimo de qualidade de vida aos indígenas para sua sobrevivência.

Atrelado à essa inoperância está a dívida histórica do estado brasileiro com os povos indígenas na garantia de proteção e demarcação de seus territórios gerando e, consequentemente, impedindo a produção de alimentos, pois somente a política de distribuição de cestas básicas não tem sido suficiente e muitos procuram as cidades na ânsia de saciar a fome.

Não há como falar da fome sem citar as suas consequências, pois à ela está associada a garantia da saúde, porém o que se vê é uma insegurança por parte da Sesai (Secretaria Especial de Saúde Indígena) que tem procurado se ater às ações de prevenção e combate ao Covid-19 nas aldeias indígenas.

Não menos inoperante, a Funai (Fundação Nacional do Índio), sucateada muito pouco tem feito de novo para colaborar com a autonomia dos povos indígenas, preocupando-se em indicar novos coordenadores para suas sedes regionais ou leiloando obras de arte que na visão do novo presidente do órgão representa a esquerda.

A situação dos povos indígenas dos que aqui residem é dramática. Se não bastasse o preconceito latente e velado, se acentuaram com o início da pandemia a fome, a sede, a desnutrição, o alcoolismo e outras drogas e um alto índice de suicídio. Tal fato somente mudará quando diminuir o desconhecimento da população não indígena que insiste de que é preciso uma “integração”, pois o que se percebe é uma tamanha ignorância relacionada à população indígena e a omissão do estado brasileiro à essas questões. É preciso exaltar aqui a luta das comunidades para vencer essa guerra, enfrentando todos os problemas sociais. A situação pandêmica apenas reforça as desigualdades, nunca houve respeito à diversidade brasileira, negando a gravidade do momento onde impera o racismo. Precisamos ter coragem para seguir adiante nesta luta, pois somos sementes que brotam da terra.

Amambai - Mato Grosso do Sul, 02 de julho de 2020.

Professor Ismael Kaiowa

Tekoha Guapoy

 

* O Comitê para a Promoção dos Direitos Humanos, Igualdade Étnico-Racial e de Gênero do IFSP Câmpus Presidente Epitácio gostaria de agradecer ao Professor Ismael Kaiowa, que atendeu prontamente ao nosso convite e colaborou com a escrita desse texto.

 

Para saber mais:

https://www.socioambiental.org/pt-br/blog/blog-do-monitoramento/a-vida-e-a-luta-de-marcal-de-souza-tupai

https://pib.socioambiental.org/pt/P%C3%A1gina_principal

 

Para ler os outros textos da Campanha “Fique de olho nos seus Direitos em Tempos de Pandemia”, acesse: https://pep.ifsp.edu.br/index.php/comite-para-promocao-dos-direitos-humanos?layout=edit&id=1642

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